01/09/2025
Pais, familiares e até educadores muitas vezes recorrem à comparação como forma de estimular a criança a melhorar seu comportamento ou desempenho. Frases como “seu irmão é mais organizado” ou “seu colega aprende mais rápido” parecem inofensivas, mas, na prática, carregam consequências que podem comprometer a saúde emocional, a motivação e até as relações sociais dos pequenos. A infância é uma fase de formação da identidade e da autoestima, e colocar crianças em padrões de comparação mina a segurança necessária para esse processo.
Cada criança se desenvolve em um ritmo próprio. Algumas falam cedo, outras demoram mais; umas demonstram facilidade em matemática, outras se destacam em esportes ou artes. Quando um adulto desconsidera essas diferenças e estabelece comparações diretas, a mensagem transmitida é de que o que a criança faz não é suficiente. O resultado pode ser baixa autoestima, sensação de incapacidade, tristeza e raiva.
Estudos em psicologia infantil apontam que crianças frequentemente comparadas apresentam maior tendência a quadros de ansiedade e insegurança. Essa prática pode gerar ainda rivalidades entre irmãos, distanciamento emocional dentro da família e resistência ao ambiente escolar. A criança passa a acreditar que está sempre em desvantagem, internalizando papéis de “menos capaz” ou “pior do que os outros”.
Não apenas quem é colocado em posição de “inferioridade” sofre com a comparação. A criança frequentemente elogiada como “a melhor” ou “a mais inteligente” também pode sentir o peso das expectativas. O medo de errar, a ansiedade em manter o padrão e a dificuldade em lidar com fracassos tornam-se obstáculos significativos em seu desenvolvimento. “Comparar constantemente coloca as crianças em um jogo de ganhar ou perder, quando o que precisamos é oferecer oportunidades para que cada uma descubra seu caminho de forma saudável e única”, explica Derval Fagundes de Oliveira, diretor do Colégio Anglo Salto.
No ambiente familiar, esse hábito é bastante comum. Pais, muitas vezes sem perceber, dizem coisas como: “Seu primo só tira nota alta” ou “Olha como seu irmão ajuda mais”. Essas frases, em vez de motivar, reforçam a ideia de que a criança não é suficiente. Com o tempo, podem criar rivalidade entre irmãos ou sentimentos de rejeição em relação aos pais.
No ambiente escolar, a situação também acontece, ainda que de forma velada. Professores que usam determinados alunos como referência para toda a turma contribuem para a ideia de que há um padrão único a ser seguido. Isso pode desmotivar aqueles que encontram dificuldades e reduzir a autoconfiança.
Outro ponto delicado são as comparações indiretas promovidas pelas redes sociais. Fotos, vídeos e relatos de conquistas de outras crianças alimentam nos pais uma sensação de cobrança e, muitas vezes, esse peso recai sobre os filhos. Ao ouvir comentários sobre “o filho do vizinho que já fala inglês” ou “a colega que ganhou medalhas”, a criança passa a sentir-se em constante competição, mesmo quando não deseja estar nesse cenário.
É possível estimular as crianças de forma positiva, sem recorrer a comparações prejudiciais. Uma alternativa saudável é valorizar o progresso individual. Em vez de medir o desempenho de uma criança em relação a outra, os pais podem mostrar a evolução dela em diferentes momentos de sua própria trajetória: “Olha como você está lendo mais rápido do que no mês passado” ou “Percebeu como hoje você conseguiu se concentrar por mais tempo?”.
Essa prática reforça a autoconfiança e promove uma percepção mais realista e saudável sobre as próprias conquistas. O reconhecimento do esforço também deve ser priorizado. Quando a criança entende que sua dedicação é vista e valorizada, sente-se encorajada a continuar tentando, mesmo diante de dificuldades.
Outro ponto importante é separar comportamento de identidade. Dizer “você está desorganizado hoje” é diferente de afirmar “você é desorganizado”. A primeira frase aponta uma situação pontual e pode ser mudada; a segunda rotula a criança e prejudica sua percepção de si mesma.
Estímulos como a empatia e a escuta ativa são fundamentais. Colocar-se no lugar da criança e refletir sobre como ela interpreta as palavras recebidas evita danos emocionais duradouros. Muitas vezes, uma frase dita rapidamente, sem intenção de ferir, é absorvida como rejeição ou crítica profunda.
Família e escola precisam caminhar juntas para evitar comparações prejudiciais e construir ambientes mais acolhedores. Professores podem substituir exemplos comparativos por valorização de esforços coletivos, mostrando que cada aluno contribui de forma única. Em casa, os pais podem criar espaços de diálogo em que os filhos compartilhem conquistas sem medo de julgamento.
A comparação é um hábito cultural enraizado, mas pode ser substituído por práticas mais construtivas. Reforçar talentos individuais, apoiar dificuldades sem críticas e reconhecer pequenas vitórias diárias ajudam a criar crianças mais seguras, autônomas e felizes.
A infância deve ser um período de descobertas, não de cobranças baseadas em padrões externos. Crianças que crescem livres da pressão da comparação tendem a desenvolver maior resiliência, autoestima fortalecida e disposição para aprender de forma genuína. Já aquelas submetidas constantemente a esse peso podem carregar marcas emocionais que se estendem até a vida adulta.
Substituir a comparação por incentivo positivo não significa ausência de limites ou regras, mas sim um olhar respeitoso para cada trajetória individual. Cada criança tem seu tempo, seus talentos e seus desafios. Reconhecer isso é um investimento no presente e no futuro, garantindo não apenas melhor desempenho escolar, mas também adultos mais equilibrados, empáticos e conscientes de seu valor.
Para saber mais sobre comparação entre crianças, visite https://experimenteliteratura.com.br/parentalidade/por-que-comparar-criancas-faz-mais-mal-do-que-bem/ e https://psi-anagoncalves.pt/impacto-da-comparacao-nas-criancas-e-adolescentes/